terça-feira, 30 de outubro de 2012

Tian An Men - 1989 - da deriva revisionista ao motim contrarrevolucionário - Ludo Martens (Segunda Parte)


TianAnMen – 1989 – Da deriva revisionista ao Motim Contrarrevolucionário (Segunda Parte)

Por: Ludo Martens

Traduzido por:Ícaro Leal Alves

Originalmente publicado em: Etudesmarxistes y autores, nº 12, 1 de septiembre de 1991

Traduzido de acordo com a versão em espanhol disponível em: http://www.forocomunista.com/t6550-ludo-martens-tian-an-men-1989

 

Preparação Sistemática da Violência

Se é indiscutível que a maioria dos estudantes não queriam a violência, é também evidente que a direção do movimento, desde o principio e de forma sistemática, preparou os ânimos para o enfrentamento e a violência.

            Em 21 de abril de 1989 se faz, desde a universidade de Beida, um chamamento a greve. “Queremos fazer progredir a democracia pela sinceridade do nosso sacrifício, pouco importa a repressão, escalaremos montanhas de laminas cortantes, nós submergiremos em oceanos de fogo!”[1], é uma linguagem que chama ao sangue.

            Outro jornal mural de 23 de abril segue textualmente a propaganda de Formosa: “a democracia e a liberdade é o fim de nossa greve. A luta é inevitável, temos de aceita-la sem temor. Haverão vitimas, porém o sacrifício vale a pena. Podemos aceitar a dor de haver nascido na escravidão? Nascemos livres, eles querem fazer-nos escravos.”[2] É uma tática posta em prática desde há muito tempo pela CIA para a luta nos países socialistas: evitar por tanto tempo quanto seja possível o enfrentamento direto com os órgãos da ditadura do proletariado; ganhar uma vasta influencia entre as massas vacilantes proclamando sua vontade pacifista; preparar psicologicamente o enfrentamento inevitável para, finalmente, destacar que as autoridades puseram em marcha a agressão e que os manifestantes tem direito a legitima defesa.

 

            Em 13 de maio, os dirigentes decidem dramatizar a luta começando uma greve de fome de 3.000 estudantes. Preparando o enfrentamento, falam cada vez mais a frequentemente da morte. Na petição da greve de fome, os estudantes da universidade de Pequim falam do momento crucial, de vida ou morte, que decidirá a sobrevivência ou o naufrágio da nação. “A morte não é nosso fim. Porém se a morte de uma pessoa pode melhorar a vida de muitos outros, se pode conseguir uma nação prospera e poderosa, então não temos o direito de atuar vilmente.”[3] Um professor chinês de inglês explica a um jornalista do Libération a tática seguida pelo movimento. “A direção do Partido comunista deve, primeiro, reconhecer a associação de estudantes e a legitimidade do nosso movimento. porém estas são só nossas primeiras demandas. Devem abandonar a praça. E se utilizam a violência, passará na China como na França de 1789, a tomada da Bastilha.”[4]

            Em 22 de maio, a estudantada da Praça Tian An Men eleva ainda mais a temperatura. “Li peng e Yang Shangkun deram um golpe de Estado contrarrevolucionário. Destituíram o secretário-geral Zhao Zhiyang. Todo o povo deve esmagar este golpe de Estado e rechaçar o governo de Li Peng.”[5] Esmagar um golpe de Estado contrarrevolucionário: é possível fazer isto com gentileza e pacifismo?

            Na terça-feira, 30 de maio, uma bandeira ondeia sobre a Praça Tian An Men: “o 1789 da China”, abertamente apelando a uma revolução para derrotar o regime. Wang declara a um jornalista do Libération: “a história prova que não se pode conquistar a liberdade sem o recurso da violência. É lamentável, porém o sangue deve fluir. Na China não chegou ainda o momento. A violência nos afastará das massas. Primeiro temos que despertar o povo e ganhar seu apoio para a causa da democracia.”[6]

            Às 21 horas do dia 3 de Junho, antes da intervenção das forças da ordem, quando Chai Ling pede aos estudantes da praça que levantem a mão e jurem: “pelo progresso do nosso país até a democracia, pela prosperidade de nosso país e para impedir que um milhão de chineses morram na guerra, juro proteger a Praça Tian An Men e a República com a vida. Nossas cabeças podem ser cortadas e podem derramar nosso sangue, porém a praça do povo não se pode perder. Estamos prontos para brigar até o fim até o último de nós.”[7]

Os pacifistas: “Sabemos que deve correr o sangue!”

Encontramos uma discussão extremamente significativa e reveladora do “caráter pacifico” do movimento, na revista Problems of Communism, publicada pela Agência de informação do governo norte-americana. Prova, indiscutivelmente, duas coisas. Primeiro: a opção não violenta do movimento de Pequim era uma simples tática, uma manobra inteligente para recolher um apoio tão grande quanto fosse possível para as atividades e as teses anticomunistas. Em segundo lugar: há uma divisão de papeis. Enquanto as vozes “oficiais” cantavam a não violência, elementos “especializados” estavam preparados para a violência. Isto é o que diz a revista do governo norte-americano a proposito da “ação sem violência” destes dirigentes estudantis tão inocentes: “Considerações de tipo prática aconselharam uma aproximação não violenta. O regime comunista, todavia controla forças militares e policiais impressionantes. O exército e as forças da policia se mantiveram firmemente do lado do regime. Seria ilusão para o movimento democrático reunir-se nas montanhas como fez Mao nos anos trinta. Os democratas dizem que se a violência tem um papel no futuro da China, terá que vir do interior do exército chinês. O presidente da Primavera da China, Hu Ping, disse no Quarto Congresso da organização em Los Angeles: “Nossa organização não tem a força de dar um golpe militar”. Wan Runnan, da Federação Democrática afirmou: “Nosso principio da ação sem violência não significa que o sangue não correrá. Há uma divisão de papeis. Nosso papel é organizar atividades agradáveis, racionais e não violentas. Porém, outros cumpriram outros papeis.” A ação sem violência e o apoio ao socialismo oferecem as melhores possibilidades para construir uma grande coalizão contra o regime e para atrair ao máximo de apoio oficial e não oficial no estrangeiro. Um dirigente da Primavera da China declarava no momento dos debates do Quarto Congresso: “só a bandeira dos métodos pacíficos pode reunir uma audiência ampla e plural. Se alguém aqui me pedisse dinheiro para fuzis, daria certamente os fuzis para a caça de aves.” [8]

Os amotinados atacaram primeiro

Quando o exército e a policia quiseram reestabelecer a ordem, depois de duas semanas de trabalhos explicativos, os primeiros feridos, os primeiros mortos também, caíram do lado do exército.

            O jornal Libération descreveu os acontecimentos da sexta-feira, 2 de junho,  nesses termos: “as massas se lançaram sobre os militares, a imensa maioria muito novos e sem armas. Milhares de soldados foram feitos prisioneiros. Seus oficiais os ordenavam que não resistissem.”[9] No sábado, 3 de junho, as 15 horas, o jornalista do Libération anotou que manifestantes atearam fogo a veículos militares. E continua: “armas, recolhidas de um dos veículos, apresentam-se. Pequim tinha já, esta tarde, um ar de motim.” “Sem violência não podemos conquistar mudanças. Devemos nos preparar para isso. Não tememos a violência”, grita um operário. Esta violência já está no ar. No sábado, as cinco da tarde, no Palácio do Povo, jovens patrulham com pedras e largos cassetetes recolhidos das mãos dos policiais. “Estamos preparados para o sacrifício”, clama um orador improvisado. Se cai um de nós, serão um milhão os que se levantam”. As massas gritam: abaixo o regime fascista! Cada vez mais gente fala de “responder a violência do Estado.”[10]  Lemos em Le Soir: “ao redor de quilômetros, tanto no oeste como no este da Praça Tian An Men, a avenida Chang’na não é mais que uma sucessão de barricadas.”[11] O jornal direitista The Far Eastern Economic Review escreve: “Na tarde de 3 de junho, uma nova intervenção de soldados a pé e desarmados foi parada diante do Hotel de Pequim, porém, desta vez, alguns soldados são golpeados brutalmente por bandos de jovens criminosos que apareceram pela primeira vez na Praça Tian An Men com barras de ferro e cassetetes. Durante vários incidentes, vários soldados perdem a vida, golpeados por mãos e pedras. Em Chong Wen Men, o corpo de um soldado foi queimado. Em outro incidente, manifestantes mutilaram o corpo de um soldado.”[12] Um cidadão belga em Pequim declara por telefone: “primeiro enviaram os tanques do 38º Exército contra os ocupantes de Tian An Men. Trataram para que não houvesse violência. Não conseguiram, houve mortos em suas fileiras.”[13]

            Quem são estes grupos de assassinos? Johan Galtung examinou os vídeos da violência e escreveu: “se movem rápido e muito, lançam coquetes molotov, sabendo exatamente como destruir um veiculo, até um tanque. Aparentemente, têm uns trinta anos.”[14] Podemos razoavelmente pensar em agentes vindos de Formosa, essa base mundial de esquadrões da morte, agentes que podem atuar desde há muito tempo graças a passividade e a frouxidão do governo, e tem um papel importante nesta violência. Formosa tem interesses em que o movimento termine violentamente e tem os meios para realizar as provocações necessárias para este fim.

Empurrados deliberadamente para a morte?

Até um jornal tão anticomunista como o Libération, se viu obrigado a sugerir a hipóteses segundo a qual os dirigentes do movimento estudantil provocaram deliberadamente o fim violento de um movimento que sabiam perdido. Libération cita um dirigente ligado ao Ocidente, Lao Um: “duas semanas antes da matança, sabíamos que tudo estava perdido e Wang Juntão fez preparar documentação falsa para assegurar a fuga dos intelectuais e de alguns estudantes que dirigem o movimento, entre os que estava eu.” E Libération formula a pergunta necessária: “Por que Wang Juntão se opôs a evacuação de Tian An Men, enquanto as informações comunicadas aos ativistas pelo jornalista Dai Qing, alguns dias antes, falavam de uma iminente e indiscriminadas intervenção militar? Alguns dirigentes do movimento consideravam que um mártir serviria melhor a causa?” “Toda a estratégia do movimento se baseou em buscar um mártir”, reclamava recentemente um dos líderes da rede democrática.[15]

O exército tinha a obrigação de acabar com o motim

Em 4 de junho, era urgente para o exército intervir para encerrar aquelas provocações assassinas e aquela ocupação da Praça Tian An Men.

            Desde o 1 de junho, A Voz da América informava sistematicamente que unidades do exército estavam a ponto de enfrentar-se entre elas, que os soldados se negavam a impor a lei marcial, que o governo não contava com nenhum apoio. Em outras palavras, a emissora de rádio da CIA incitava abertamente a insurreição.

            O exército não podia eclipsar-se ante a violência e os assassinatos, tampouco podia permitir que os anticomunistas continuassem ocupando o coração da capital. Isto seria considerado por todas as forças antissocialistas como uma expressão da impotência do exército ante as forças da contrarrevolução, como um indicador da paralisia e da debilidade do governo e, já que logo, podia ser derrubado.

            A intervenção do exército para por fim ao motim anticomunista se fazia necessário, porém, constituía, ao mesmo tempo, a prova do fracasso de certa política. A orientação pró-capitalista, ou, pró-imperialista de Hu Yaobang e de Zhao Zhiyang provocam um descontentamento justificado na população, criando uma grande confusão política. Não compreendendo o alcance do programa do núcleo duro de Tian An Men, uma parte da população de Pequim se opõe a intervenção do exército.

            Para combater a violência justificada com que o país socialista se defende contra o imperialismo, os piores fascistas juram pelo humanismo e o humanitarismo. Isto demostra que quando uma força política começa a falar de humanismo é necessário fazer sempre uma analise de classe. O porta-voz do governo fascista de Formosa, no relativo as ingerências norte-americanas na República Popular da China, comenta: “os Estados Unidos provaram que eram dignos de ser os dirigentes do mundo livre ao manter bem altos os princípios do humanismo e dos direitos humanos.”[16] Agora, nos primeiros meses de 1990, em El Salvador, grupos fascistas enviados por Formosa, bombardeiam cegamente os bairros populares da capital, massacrando a população. Em visita a Formosa, em 21 de fevereiro deste ano, o presidente salvadorenho, Christiani, declarou: “Juntos marchamos pelo caminho da liberdade e da democracia.”[17] No momento da agressão contra Panamá, um Estado independente, os Estados Unidos mataram, segundo Eduardo Galeano, a 7.000 pessoas. Todos os crimes inqualificáveis do imperialismo, sistematicamente são apagados da memória de nossos povos, enquanto que a repressão justificada dirigida contra a sublevação imperialista, em Pequim, é recordada pela BBC, diariamente, semana após semana desde há mais de um ano, como o maior crime contra a humanidade. Não podemos estar do lado dos povos de El Salvador, da Guatemala, de Granada, do Panamá, da Argentina, das Filipinas, povos aterrorizados pelos Estados Unidos e por Formosa, e não estar do lado do governo socialista chinês que combate as tentativas de reconquista da China por parte de Formosa e dos Estados Unidos.

A China numa encruzilhada

Como pensar o futuro deste país imenso que é a China Popular, uma ano depois da repressão do motim contrarrevolucionário de Pequim?

            Hoje, existe o risco de que a agitação contrarrevolucionária levante-se de novo e sempre existe o perigo de que a linha revisionista e pró-capitalista se faça com a direção do Partido Comunista Chinês. Se dessa maneira a direita pode minar o interior do Partido para depois arremata-lo, China se submergirá em um caos catastrófico que, em alguns anos, custará a vida de milhões de pessoas.

           A China poderá evitar este cataclismo se a correção, a retificação e a revolucionarização do Partido Comunista continuar até o fim. Só o socialismo pode salvar a China e só o Partido Comunista pode dirigir a construção socialista. A história recente tanto da Europa de Leste, como da China, nos diz que nos países socialistas existem dois tipos de luta de classes.

            Uma contra os reacionários, os elementos inimigos do socialismo, os agentes do imperialismo. E outra luta que tem lugar no interior do Partido para a conservação da suas tradições revolucionárias. Está luta pela revolucionarização constante do Partido, está luta contra as tendências de degeneração é sem dúvida, a mais complexa, porém também a mais crucial.

            Nós estamos em desacordo com os que fazem da luta pela “democracia” a questão essencial. O exemplo de Tian An Men demostra claramente que a palavra “democracia”, supostamente acima das classes é utilizada para propagar o desenvolvimento livre de toda classe de organizações antissocialistas e pró-imperilistas. Assim, a “democracia” é a consigna em Formosa e significa, nestes casos, o direito do partido fascista Kuomintang de regressar a China. Defendemos o desenvolvimento da democracia socialista, quer dizer, a participação ativa e constante das massas populares na edificação do socialismo, em sua defensa e no aperfeiçoamento de seu sistema político e econômico. O desenvolvimento da democracia socialista está condicionada pela revolucionarização do Partido. Um elevado grau de democracia socialista depende do trabalho exemplar dos comunistas, de seus laços com as massas, de seu estilo de vida simples e de luta dura, de seu espirito de sacrifício, de sua fidelidade, não em palavras, senão em feitos, ao marxismo-leninismo e de sua capacidade de centralizar todas as ideias progressistas das massas.

Porém o Partido cometeu erros...

Objetam-nos, em certas ocasiões, que o Partido Comunista Chinês cometeu erros e falhas. Isso é evidente. Porém, qual são as conclusões que se retiram destas considerações? Situar-se no campo da contrarrevolução e do revisionismo é a cura para a enfermidade do socialismo? Todas as correntes demagógicas acentuaram sempre os erros e as debilidades do Partido, para impulsionar as concepções antissocialistas e contrarrevolucionárias.

            Os que apoiaram os heróis da Praça Tian An Men puderam agora constatar que apoiaram a uma direção ferozmente antissocialista e pró-Formosa. Os que apoiaram ao moderado, ao reformador, ao homem que da provas de sua flexibilidade e de sua vontade de dialogo, Zhao Zhiyang, veem hoje que apoiaram uma linha política de privatizações e mercado livre. Lutar contra os erros e as debilidades do Partido de um ponto de vista revolucionário, e lutar pela depuração do Partido dos elementos burgueses, oportunistas, burocráticos e podres, é lutar pela conservação dos princípios marxista-leninistas e por seu desenvolvimento.

Gerontocracia positivo e negativo

Os eventos na China mostrou-nos, mais uma vez, que sob o socialismo a luta de classes no partido é extremamente complexa. É necessário adotar uma atitude de estudo, de pesquisa e análise para encontrar verdadeiros os interesses de classe que estão por trás de algumas proposições tentadoras.

Queremos desenvolver está ideia, tomando o exemplo de demagogia da imprensa burguesa contra a gerontocracia, o despótico, velho e cos orrompidos conservadores opostos à juventude democrática e desinteressada.

Primeiro, na China, entre a velha guarda do partido, alguns são de direita, esquerda e centro. Vamos começar direito. Em um documento do Partido Comunista Chinês, em 1984, podemos ler: "Há um pequeno número de antigos membros e funcionários do partido que não é capaz de respeitar os princípios do partido. Quando encontram uma tendência doentia, seguem-na". "No momento que se comprometeu a discutir a abertura para o mundo exterior, algumas pessoas do governo e do Partido foram atraídas como abelhas pelo mel”.[18] na luta no seio do Partido, estes velhos defendiam as posições de Hu Yaobang e de Zhao Zhiyang e nem o imperialismo de Formosa se inquietou por sua idade, já que lutavam pela causa boa, a mesma que destes bons velhos: o papa de Roma, Ronald Reagan e Willy Brandt.

Pelo contrário, Deng Xiaoping era, para os olhos do Ocidente, o protótipo do velho tirânico e retrograda. E, sem embargo, quando Deng apoio a política revisionista de Hu Yaobang e de Zhao Zhiyang, o Ocidente não o poupou por isso. Deng defendeu a política nefasta de Zhao Zhiyang até abril de 1989. E até o momento do começo do movimento estudantil, a imprensa do Kuomintang manteve a esperança de que Deng se posiciona-se do lado da reforma e da democracia. Uma revista de Formosa escreveu: “o lugar de Deng na história depende desta decisão”.[19] Durante dez anos, o velho Deng manteve uma posição centrista, ainda inclinando-se mais a direita.

Outros velhos, como Chen Yun e Li Sien, criticaram desde há muitos anos vários aspectos da política de Deng Xiaoping. Fue Chen Yun é o que mais fortemente combateu a orientação para o mercado livre e o abandono da planificação. Também é – e vale a pena assinalar, já que Chen Yun representa, aos olhos do imperialismo, aos conservadores e corrompidos – quem com mais constância criticou todos os casos de corrupção no seio do Partido.

Resumindo, a luta de classes afeta tanto aos velhos como aos jovens, a população e ao Partido. Portanto, é preciso analisar o fundo e a coerência das diferentes correntes políticas.
A direita pró-imperialista foi derrotada na China

Qual as conclusões que podemos tirar dos meses da confrontação política em Pequim? A luta de classes que se desenvolve na primavera de 1989 acabou em uma importante derrota para a direita pró-capitalista do Partido Comunista Chinês. Junto a Zhao Zhiyang, foram depurados toda uma serie de intelectuais de direita e de extrema-direita, como Yan Jiaqi.

            No conjunto, a atual direção se situa mais a esquerda. As seguintes são algumas indicações, a primeiro no campo político e ideológico.

            Há uma nova consciência do perigo de subversão e de infiltração, organizadas a grande escala na China pelo imperialismo e por Formosa. O Partido Comunista retoma a concepção de Mao segundo a qual a luta de classes continua sob o socialismo, assim como que persiste o perigo de uma restauração capitalista e dentro do Partido Comunista Chinês, a capitulação ante o imperialismo. O Partido põe em primeiro plano o trabalho político e ideológico como principio diretivo. A necessidade dos intelectuais de fundir-se com os camponeses e operários é reafirmada. Alguns redescubriram as obras de Mao Tsé-Tung, em um intento de compreender as características da luta de classes.

No campo econômico também encontramos certos acentos novos

A planificação socialista recupera seu papel, importantes fundos são destinados à agricultura, o desenvolvimento da empresa privada se freou, a campanha contra a corrupção e contra as desigualdades se fortaleceu.

A importância de informar-se

Entretanto, a luta é complexa e seu desenvolvimento incerto. É importante seguir os debates e analisar os pontos de vista diferentes que se manifestam no seio do Partido Comunista Chinês. Queremos sublinhar a importância de obter informação de primeira mão sobre as posições dos comunistas chineses. É preciso dizer que o desprezo de numerosos progressistas ocidentais a experiência socialista de mil milhões de pessoas é simplesmente escandalosa. Os que nem sequer dãos-se ao esforço de ler os documentos do Partido Comunista Chinês, mantem fixos, com absoluta arrogância, suas críticas e suas receitas infalíveis para salvar o socialismo chinês. A mais elementar honradez intelectual nos obriga a seguir com atenção e interesse as publicações chinesas. Ali encontramos tanto analises pertinentes como teses discutíveis e, também, pontos de vista revisionistas. Informar-se objetivamente sobre a política do Partido comunista é instrutivo em si mesmo. Nem estamos obrigados a emitir um juízo sobre todas as medidas e todas as teses nem devemos mudar nossas opiniões demasiado rápido e demasiado categoricamente.

O Futuro da China é incerto

A partir de 1986, certos especialistas norte-americanos consideravam que na China chegava a um ponto em que não havia mais retorno e no qual a restauração do capitalismo era inevitável. As descoletivizações no campo, o desenvolvimento da empresa privada, a autonomia das empresas, o nascimento de uma classe tecnocrata influenciada pelo modelo ocidental, as zonas econômicas especiais, a inversão estrangeira, tudo isto, diziam, constituía uma base solida para o capitalismo. Certos revolucionários consideravam que Deng Xiaoping concluirá a restauração do capitalismo na China. Porém a mudança na orientação política e econômica, depois de junho de 1989, demonstraram a prematuridade destas conclusões.

            Poderá o Partido Comunista Chinês continuar durante muito tempo seus esforços de retificação e aprofundar suas críticas sobre os erros cometidos?

            Os especialistas em China lançam varias hipóteses sobre o futuro.

            Alguns creem que os revisionistas no Partido utilizaram um discurso “mais a esquerda” aguardando o surto de graves problemas econômicos e sociais para voltar ao poder.

            Outros consideram que a retificação política e ideológica atual será superficial, que o burocratismo, a corrupção e o parasitismo continuaram difundindo-se e que o processo de putrefação prosseguirá, como está sucedendo desde 1978. Os acontecimentos de junho de 1989 tão só seriam uma pausa na marcha face ao capitalismo.

            A terceira escola pensa que Deng Xiaoping vai virar de novo a direita para apoiar outra tendência na linha da de Hu Yaobang e Zhao Zhiyang. Recordando que em fevereiro de 1989, Deng ainda afirmava que o Partido não cometia erros importantes desde 1978. Está escola pensa que Deng regressara a uma linha de reformas de tipo capitalista.

            Estas três hipóteses falam de uma vitória final das tendências revisionistas na China.

            Outros especialistas preveem um surto na China baixo a pressão de terríveis problemas econômicos, sociais e demográficos, pelo crescimento dos particularismos províncias e pela ação das forças contrarrevolucionárias e pró-Formosa. A China conheceria então uma nova era de guerras civis vorazes cuja saída é imprevisível.

            Finalmente, podemos considerar que a direção atual do Partido conseguirá fazer uma síntese entre os princípios políticos corretos que Mao elaborou no momento da Revolução Cultural e a política econômica mais flexível posta em pratica desde então. Assim, a China poderia encontra um novo dinamismo tanto no domínio político como no econômico.

Uma confirmação de certas teses de Mao Tsé-Tung

Durante a Revolução Cultural, Mao Tsé-Tung não utilizou os métodos adequados para resolver o problema da degeneração capitalista, ainda que tenha abordado corretamente um problema crucial. A evolução política dos últimos dez anos confirmou amplamente algumas de suas analises.

            Mao disse: “se nos afastarmos das massas, se não nos esforçarmos em resolver seus problemas, os camponeses levantarão suas foices, os operários saíram a rua para manifestar-se, os estudantes provocaram distúrbios. Hoje, existe gente que crê que com a conquista do poder do Estado se pode descansar em paz e até agir como um tirano. Se se encontram com as massas que lhes recebem a pedradas ou a golpes de foice consideram que não merecem isso e sim aplausos. Não podemos deixarmo-nos contaminar por esse estilo de trabalho burocrático, que forma uma casta aristocrática apartada das massas.” “No passado, levamos a luta ao campo, às fábricas e aos meios culturais, empreendemos o movimento educativo socialista, sem chegar por isso a resolver o problema; porque não encontrávamos a forma de mobilizar as massas em todos os campos, a partir da base, para que denunciassem nosso lado negativo.”

            “A sociedade socialista abarca um período bastante largo no qual continua existindo as classes, as contradições de classe e a luta de classes, ao mesmo tempo em que a luta entre a via socialista e a via capitalista e o perigo de uma restauração do capitalismo. É necessário compreender que esta luta será larga e complexa, redobrar a vigilância e buscar a educação socialista. Tem-se de resolver corretamente os problemas relativos as contradições de classe, distinguir as contradições entre nós e o inimigo, e as contradições no seio do povo, e depois buscar uma solução justa. Se não for assim, um país socialista como o nosso passará a ser o contrário, mudará de natureza e começará a restauração capitalista.”

            No XI Congresso do Partido Comunista Chinês, Hua Kuofeng explicou um principio essencial, avançado por Mao: “afirmando que a burguesia existe no Partido comunista, o presidente Mao queria dizer que existem membros que apostam na via capitalista. Enquanto o poder do Partido e do Estado está nas mãos do núcleo que segue a via marxista-leninista, os seguidores da via capitalista serão muito poucos e serão expulsos uma depois do outro. Impedindo a formação de uma burguesia. Só quando os pró-capitalistas se apoderarem do poder do Partido e do Estado – como na União Soviética – será possível a formação de uma burguesia monopolista e a conversão do Partido numa organização burguesa.”[20]

            O imperialismo em crise lança uma ofensiva planetária para reconquistar tanto os países nacionalistas do Terceiro Mundo como os países socialistas, acentuando a exploração dos operários da metrópole.

            Um internacionalista estará sempre do lado dos operários e dos trabalhadores em luta no seu próprio país. Defenderá sempre os movimentos que, no Terceiro Mundo, combatem o imperialismo e a reação. Apoiará sempre os países socialistas, nos êxitos e nas dificuldades, e aprenderá de suas vitorias e de suas derrotas. No clima atual triunfalista da direita e do anticomunismo, é importante dar a conhecer as experiências e os pontos de vista dos países que preservaram a via socialista. Não temos que deixa nos intimidar pela arrogância estupida da direita, senão devemos atrevermo-nos a defender o socialismo, atrever-se a defender a China, Cuba, Albânia ou a República Popular Democrática da Coreia.

            Resumindo, os povos, unindo seus esforços, conseguirão enterrar o imperialismo e a causa do socialismo triunfará.

EPÍLOGO

Os ecologistas e a ofensiva do imperialismo americano

No primeiro aniversário do “movimento democrático” de Pequim, teve lugar na Câmara um debate sobre este acontecimento, em 29 de junho de 1990. Este debate nos ensinou, mais uma vez, até que ponto a lavagem cerebral diária dos meios “livres” influem sobre os meios que se consideram progressistas. Em sua intervenção, em nome do grupo ecologista Agalev-Ecolo, Xavier Winkel, conhecido por suas posturas progressistas, defende a linha seguida pela direita norte-americana. Vendo a mare de mentiras e intoxicações da imprensa “livre”, é compreensível que militantes ecologistas honrados se deixaram enganar pelas vozes das multinacionais. Buscamos debate franco, apoiado por fatos indiscutíveis, por documentos e provas. Estamos seguros de nossa causa. A arrogância do imperialismo não nos impressiona, ao contrário, estamos seguros de que as pessoas que mantêm o espirito lúcido, que não padecem da histeria antissocialista, se verão obrigadas a refletir seriamente sobre a correção de nossa postura, depois de escutar nossas provas e nossos argumentos.

            Xavier Winkel repete uma tese central do imperialismo norte-americano e europeu, quando reclama “uma continuação das reformas (na China) que tornaram possível a chegada das pessoas aos Estados democráticos”.

            No seio do poder norte-americano, bem unido na sua política anticomunista e de dominação mundial, se dividem duas tendências táticas: a fração dominante, representada por Bush e Nixon, quer manter as relações com a China com o objetivo de proteger, apoiar e animar as forças pró-capitalistas no seio do Partido Comunista Chinês. Outra fração predica um anticomunismo mais aberto e uma tática mais agressiva para, no praço mais breve possível, dobrar a China socialista e criar as condições propicias para uma contrarrevolução vitoriosa de tipo polaco, romeno ou húngaro. Xavier Winkel defende o programa desta última fração do imperialismo norte-americano. “O que não aceito - disse - é que representantes do governo belga se reúnam com responsáveis chineses.” “A China necessita manifestamente do apoio de outros países e as sanções econômicas são eficazes. A Bélgica e os doze devem manter as sanções políticas e econômicas” Em resposta, Eyskens respondeu que a Bélgica “continua mantendo uma atitude firme e decidida”. Xavier Winkel respondeu: “estou contente com a resposta do ministro.”[21]

            Isto demonstra como gente que se crê progressista, está, as vezes, completamente intoxicada pela propaganda imperialista. O Exército Popular teve que intervir em Pequim para acabar com um motim violento que pretendia derrubar o socialismo; houve trezentos mortos. Xavier Winkel pensa que todo encontro com dirigentes chineses é censurável com o sucedido e que faz falta sanções políticas e econômicas contra este país do Terceiro Mundo que conta com mil milhões de habitantes. Provavelmente Xavier “esqueceu” que o exército norte-americano acaba de cometer uma agressão militar injustificada contra o Panamá, em que foram massacradas entre 5.000 e 7.000 pessoas. Ecolo-Agalev exigiu que a Bélgica acabasse com todos os contatos com o governo norte-americano e que aplicasse sanções políticas e econômicas contra os Estados Unidos? Entretanto, estas medias estariam justificadas já que a causa do imperialismo norte-americano é indefensível. Porém, Ecolo-Agalev prefere não fazer nada contra o imperialismo norte-americano e continuar repetindo cegamente a agitação antissocialista que o conjunto das forças imperialistas manejam desde há muitos anos contra as decisões justificadas da China.



[1] Libération collection, nº 1, junho de 1989, p.30.
[2] Ibídem, p.37.
[3] Inside Mainland China, agosto 1989, p.6.
[4] Libération collection, op. cit. p.37.
[5] Ibídem, p.78.
[6] Ibidem, p.78.
[7] The Free China Journal, 15 de junho de 1989, p.3.
[8] Problems of communism, setembro-outubro de 1989, Chinese democracy in 1989, p. 2.
[9] Libération, 3 e 4 de junho de 1989.
[10] Libération, 5 de junho de 1989, p.3-4.
[11] Libération, 8 de junho de 1989, p.2.
[12] FEER, 15 de junho de 1989, p.12.
[13] De Morgen, 7 de junho de 1989, p.5.
[14] De Groene Amsterdammer, 11 de outubro de 1989, p.9.
[15] Libération, 25 de abril de 1990, p. 36-37.
[16] Sinorama, nº 8, agosto de 1989, ROC-Taiwán, Shaw Yu-ming, p.51.
[17] The Free China Journal, 26 de fevereiro de 1990, p. 36-37.
[18] Chen Yun, en Inside Mainland China, Taiwan, novembro de 1985, p. 19-20.
[19] Issues and studies, maio de 1989, Student  Démonstrations, p.6.
[20] Cidado en AlainBouc: Larectification. Fédérop. Lion, 1977, p.170.
[21] Câmara belga, reunião pública da câmara, 29 de 1990, Informe analítico, p. 1235-1237.

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